Auto da Floripes avivou memórias na aldeia das Neves

A emoção tomou conta do largo fronteiriço à igreja durante a projecção de "O Auto da Floripes", na pequena aldeia do lugar das Neves, a cerca de 15 quilómetros de Viana do Castelo. Viu-se gente feliz com lágrimas. O caso não era para menos: no dia 5 de Agosto de 1959, a população local, na sua maioria pequenos lavradores, foi chamada a participar num registo etnográfico - onde aparecem turcos e cavaleiros cristãos -, e agora, 51 anos depois das filmagens, as gentes da terra foram convidadas a rever a representação teatral. Por iniciativa do Cineclube do Porto e do Centro Recreativo e Cultural das Neves, "O Auto da Floripes" voltou a ser exibido no mesmo recinto e a magia das imagens apoderou-se de alguns familiares.


Nélson Quintas, um dos participantes das filmagens, recordou na tela o palco de outras vidas feitas de memórias. "Foi bonito de ver. Adorei", repetiu quando comentou a odisseia das imagens e das filmagens no lugar das Neves. "Empolgante. O filme fez-me recordar velhos amigos, gente que partiu e que ficou no meu coração", sintetizou José Santos, 80 anos, cameramen, fotógrafo de cena e tudo o mais numa equipa feita de amadores e amante do Cinema.

Como há gente sem memória neste país cada vez mais empobrecido e cinzento, lembre-se que este Auto feito de afectos e de gente gerososa, só foi possível de realizar graças ao empenho e sabedoria do cineclubista Henrique Alves Costa (O meu herói. O Porto e o país devem-lhe muito), ao realizador António Lopes Fernandes (que durante muitos anos filmou quase tudo na RTP) e ao apoio entusiástico do cineasta Manoel de Oliveira que, numa carta enviada a Alves Costa, escreveu palavras elogiosas sobre o documentário. "Surpreendeu-me o mais agradavelmente possível o filme do Cineclube. A frescura, a simplicidade, a naturalidade - sem nenhum pretenciosismo balofo -, da visão documental da aldeia e seus hábitos vulgares, criam um estilo próprio, inédito no cinema português, muito português, muito minhoto, cheio de real bucolismo e candura próprios. Por aqui se vê quanto pode ser frutuoso um trabalho honesto". As palavras de Oliveira foram publicadas em 1963, num programa do CCP sobre o filme/documentário.
Há dias, por entre nostalgias e imagens de grande simbolismo, "O Auto da Floripes" voltou a ser projectado numa réplica das velhas máquinas do "Cinema Paraíso" e toda a gente bateu palmas. A aldeia parou para assistir à festa. E até a lua foi espreitar a pantomima rodada no lugar das Neves.





Comentários