Amigo


O poeta Alexandre O´Neill continua fazer-nos muita falta. Lembro-me dele sempre que oiço falar deste país amaldiçoado e cheio de videirinhos. Da sua poesia que nos deixou, mas também das suas intervenções certeiras na TV e modo irónico como nos surpreendia. Poeta do surrealismo, soube retratar magistralmente este país à deriva e os portugueses. Retenho na memória títulos de rara acutilância e criatividade  ("No Reino da Dinamarca" e "O Princípio da Utopia", mais a "Poesia  Completa"),  crónicas saborosas publicadas nos anos 70 no suplemento "A Mosca", do extinto Diário de Lisboa. E hoje topei este poema lindíissimo intitulado "Amigo".  Aqui fica. Que faça bom proveito. 






Mal nos conhecemos
Inaugurámos a palavra «amigo»
«Amigo» é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!
«Amigo» (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de inimigo!
«Amigo» é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada.
«Amigo» é a solidão derrotada!
«Amigo» é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
«Amigo» vai ser, é já uma grande festa!

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