Em vésperas de Natal as ruas da Baixa portuense voltam a ficar cheias de gente apressada. Muitos andam de iPhone na mão, talvez o único sinal de riqueza e de modernidade num país cada vez mais desigual, resignado e traído nas expectativas de uma vida melhor. Apesar da crise e dos cortes profundos na algibeira o consumismo continua a funcionar como um íman. Colou-se à pele e tornou-se irresistível para muitos.
“Em 2012 vamos ficar mais pobres do que hoje”, alertou o reformado sentado no café, até há pouco tempo cheio de fregueses do mercado do Bolhão e agora “com meia dúzia” de pessoas. Como a quadra aconselha e sugere, desejam-se Festas Felizes, trocam-se cumprimentos. O semblante de muitos é triste e cinzento. “No mês passado fiquei desempregado. O Natal deixou de ter sentido”, escutei diante do Via Catarina, dantes sede de um jornal honroso e agora centro comercial atulhado de mirones, velhotes a contar histórias e comerciantes a fazer contas à vida.
De volta à Rua de Santa Catarina, onde Camilo casou com Ana Plácido lá está o habitual vendedor de castanhas junto à escadaria do metro, o grupo de tocadores a improvisar ritmos latino-americanos, homens vestidos de palhaços a encher balões para a criançada, a cantora ucraniana a entoar melodias de um Natal frio e distante ao lado do Majestic, mais a vendedeira de relógios “bonitos e baratos”. “É tudo a cinco euros”, apregoava outra comerciante aos interessados em camisolas e “meias quentinhas” para o Inverno.
Mesmo com iluminações pindéricas (por causa da crise, dizem) o frenesim das compras não teve descanso. Poucos sabem que, aqui nesta rua de saldos e montras enfeitadas, um homem de barbas brancas enrola-se todos os dias nas mantas já gastas pelo tempo e tenta sobreviver com a solidão. Será o Pai Natal?
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