Por estas bandas há muito futebol, pão
e circo, mais circo do que pão. Muitos guineenses andam de transístor colado ao
ouvido, talvez à espera de boas notícias, mas a maioria deixou de acreditar nos
amanhãs que cantam e perdeu a esperança em dias melhores. Este povo é um
resistente, dá lições de sabedoria ao mundo. Quer seja no mercado de Bandim, um
formigueiro de gente e onde se vende literalmente de tudo, ou nas ruas de
Bissau velho, sujo e imundo, as mulheres travam diariamente uma luta pela vida.
Vendem de tudo que a terra dá:
limões, frutas, batatas, cebolas, mais ovos e doses de mancarra. Com os seus
filhos às costas transportam não só o drama familiar, como também a cruz de um
povo sofrido e sofredor, cansado de lutas palacianas, vivendo num país adiado,
exaurido, entregue à sua sorte. E no entanto, a Guiné-Bissau tem tudo para ser
um país desenvolvido. Possui recursos naturais - bem aproveitados podiam
permitir o tão almejado “desenvolvimento sustentado” -, mares com abundante
peixe, uma floresta com árvores centenárias e madeiras preciosas (consta que os
chineses andam a dizimar a floresta perante o olhar cúmplice das autoridades
locais), mais dezenas de ilhas e praias de grande beleza e exotismo, uma
biodiversidade única no planeta.
Na capital onde tudo acontece existem lojas de
comércio, supermercados e restaurantes, onde se paga mais do que numa qualquer
cidade europeia. Também existem alguns espaços de lazer e animação nocturna e
aos sábados à noite, surgem luxuosos carros todo-o-terreno, jovens com múltiplos
sinais exteriores de riqueza. Porém, só uns quantos entram na festa. A maioria
da população não tem dinheiro para quase nada, medicamentos em caso de malária
ou paludismo e sobrevive em tabancas cobertas de zinco, sem luz, água potável,
caminhos por onde Cristo nunca passou.
Aos domingos, o campo da bola enche-se
de gente, milhares de pessoas nas bancadas, muitos dependurados nas torres de
iluminação pública sempre desligadas devido à crónica falta de electricidade. Só
o futebol traz alegrias e alivia pesadelos. O futebol, sempre o futebol como paixão e tema de conversa. Entre os
muitos cooperantes que por aqui andam ao serviço das inúmeras ONG´s o pontapé
na bola também alimenta rivalidades clubísticas, todas resolvidas com “fair-play”
e sorrisos de circunstância. No top das preferências, a maioria gosta do
Benfica, depois torce pelo Sporting e por último, o tricampeão Futebol Clube do Porto.
Evita-se falar de política e dos políticos, dos militares autores do último golpe,
muito menos do tráfico de droga e outros negócios escuros. As lutas travadas no
seio do PAIGC também passam ao lado. O anunciado recenseamento eleitoral é uma
miragem. As eleições estão marcadas para 2014. Poucos acreditam na mudança. Há muito
futebol por aqui, pão e circo, mais circo do que pão.
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