“O Luzido Cortejo dos Fenianos”

 

  

Os Fenianos festejForam 110 anos de história. O Clube nasceu antes da República e foi famoso pelos cortejos realizados na Invicta, prémios ganhos nos concursos internacionais de Ilusionismo. Ontem como hoje continua a fazer truques de magia para sobreviver, conquistar sócios e alargar o leque de iniciativas culturais. No dia 25 de Março será tempo de recordar o passado e pensar no futuro.

Foi no ano de 1939, que o Entrudo ressuscita na cidade do Porto pela mão do Clube Fenianos Portuenses, num longo e demorado cortejo com 80 carros alegóricos que desfilaram pelas ruas do Porto.

Em1939, os Fenianos promoveram um cortejo com 80 carros alegóricos pelas ruas do Porto.
No primeiro quartel do século XX o Porto vestiu os melhores disfarces para apreciar o Carnaval organizado pelos Fenianos. Com máscaras de encantar seduziu meio mundo. “El-Rei Carnaval diverte-se!” escreveu o JN no dia 28 de Fevereiro de 1939. O desfile ocupou totalmente a primeira página do matutino e ilustrou a folia com uma dezena de fotos. O título traduz encantos: “O Luzido Cortejo dos Fenianos”. Durante as décadas de 50 e 60 foram só glórias. Depois fez-se um “intermezzo” até aos anos 80 e quando recomeçou já não foi a mesma coisa. “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”.
Ainda hoje muita gente não esqueceu o “fabuloso cortejo” carnavalesco dos Fenianos nas ruas do Porto. Por nostalgia ou saudade dos “bons velhos tempos”, o certo é que o Porto de antigamente recorda-o como uma “coisa bonita”, milhares de pessoas nas ruas, festa de arromba, em grande parte suportada pelos comerciantes da cidade.
Folheio alguns álbuns de glórias da centenária instituição portuense e admiro imagens de multidões na Baixa do Porto, Clérigos, Santa Catarina, Avenida dos Aliados, janelas com flores e bandeiras, foliões vestidos de arlequim, adereços de fantasia e criatividade. Uma delícia. Vejo desenhos de Rafael Bordalo Pinheiro, esse mesmo, o autor da representação popular do Zé Povinho, aguarelista, ilustrador, decorador, caricaturista, jornalista. E fico deslumbrado.
Antes e depois da República o Carnaval do Porto foi sempre uma alegria contagiante. Por exemplo, nos cortejos dos anos 50 exibem-se gigantones, carrinhas com esculturas de papelão, alguns delas publicitando o Bolo-rei da Cunha e o programa radiofónico “A Voz dos Ridículos” (dos humoristas João Manuel e Vê Beludo) o “monstruoso” dragão à solta com enfeites e serpentinas, grupos musicais, carros decorativos do Orfeão da Madalena, Orfeão de Matosinhos, Orfeão do Porto, o Colégio Brotero, da Foz do Douro, outro ainda da vizinha Galiza.
“Foi uma época de ouro, grandiosa, mas os clubes são como as pessoas. Têm altos e baixos. Os Fenianos nasceram por causas cívicas e culturais. O Clube teve a sua génese em 1904, meia dúzia de anos antes da implantação da República numa reunião dominada por ferrageiros da Rua do Almada. A organização do corso carnavalesco foi o pretexto para servir a cidade”, adiantou Fernando Coimbra, presidente da centenária instituição.
Existem outras memórias para contar. Os prémios ganhos nos concursos internacionais de Ilusionismo, os feitos da secção de Bilhar, as actuações do Grupo Coral, Danças e Cantares Tradicionais, os famosos bailes dos anos nos anos 60, os apoios dados à Liga Portuguesa de Profilaxia Social e aos grupos culturais, o Teatro Experimental do Porto, o TEP de boa memória.
Pelos Fenianos passou gente de gabarito intelectual como António Pedro, renovador do teatro português, pintor e encenador, Bernardo Santareno, dramaturgo e escritor, Júlio Resende, pintor, aguarelista, “grande mestre da arte portuguesa do século XX”. Na sua biblioteca guardam-se muitas memórias do Porto antigo, tesouros bibliográficos, uma edição especial de “Os Lusíadas”, obras completas de Voltaire, livros de Garrett, Camilo, Ramalho, Eça, Pascoaes, Raul Brandão, os grandes vultos da literatura do século XX.
Em 1939, o JN elogiou o “maravilhoso desfile” dos Fenianos e deu-lhe honras de primeira página. O tradicional cortejo das multidões passou de moda e hoje é uma recordação afectiva na memória de milhares de portuenses. O Carnaval das genuínas tradições culturais já só acontece longe das cidades, nas aldeias do “país real”. O resto são fantasias.

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