Uma viagem no tempo através da música e património


Recriar a música em lugares com história e património. Atrair novos públicos e turistas para a enorme herança musical deixada por compositores e artistas. Proporcionar um encontro de culturas entre o Ocidente e o Oriente, eis alguns dos objectivos do Festival In Spiritum que, irá decorrer entre os dias 19 e 23 em diferentes palcos e edifícios de grande simbolismo do Porto.
O regresso do aclamado Jordi Savall e do agrupamento Hespèrion XXI (dia 21, Salão Árabe do Palácio da Bolsa) será, com toda a certeza, um dos momentos mais aguardados do certame. A direcção artística está a cargo do maestro Cesário Costa.
Foi em 2014 que o Festival de Música do Porto começou a atrair atenções do público e de então para cá, com mais ou menos sobressaltos de percurso, o certame tem vindo a consolidar-se, a conquistar cada vez mais melómanos, simples amantes de música, entre os quais, milhares de turistas da cidade cosmopolita e curiosos de descobrir a cidade classificada pela Unesco como Património da Humanidade.
Com uma particularidade: os concertos acontecem quase sempre em edifícios históricos, muitas vezes à margem do roteiro deste tipo de manifestações artísticas e culturais. Um exemplo: em 2107, um dos palcos escolhidos foi a Igreja de S. Francisco, famosa pela acústica e majestosa pelo barroco da sua talha dourada. Foi um êxito retumbante.
O mesmo aconteceu, por exemplo, na igreja dos Clérigos, cujos bilhetes para ouvir obras de Vivaldi esgotaram rapidamente. “Por isso muita gente ficou em fila de espera na expectativa de assistir ao concerto”, recordou o director artístico do Festival.

Astória, café com história

A exemplo do que sucedeu em edições anteriores, o certame irá acontecer não só em alguns edifícios emblemáticos da cidade – Salão Nobre da Câmara Municipal do Porto ou a Casa do Infante -, como estenderá a outros locais nem sempre escolhidos na rota dos grandes acontecimentos culturais, como o Conservatório de Música do Porto, Ateneu Comercial do Porto ou o Café Astória (situado no Hotel Intercontinental) cujo programa irá recriar atmosferas e ambientes vividos ao longo dos séculos em diferentes cafés históricos da Europa.
Um parêntesis para recordar que, neste local, entre a Praça de Almeida Garret (em frente à Estação de S. Bento) e a Praça da Liberdade, esteve instalado durante muitos anos ao longo do século XX o Café Astória que, agora, foi recriado no edifício da referida unidade hoteleira.
Voltando ao programa do festival um dos testemunhos musicais chama-se, precisamente, “Cantata do Café” (1732), de Bach, uma encomenda feita ao afamado músico pelo dono do famoso Café Zimmermann, em Leipzig, na altura considerado um “espaço de encontro de artistas, partilha de composições recentes e discussões estéticas”.
Pois bem, a obra de Bach merece honras de abertura do Festival (dia 19, às 17, 30 horas) e terá como instrumentistas os alunos do Curso de Música Antiga da ESMAE. À noite (21, 30 horas, Casa do Infante) será a vez do Grupo Vocal Olisipo, sob a direcção de Armando Possante, dirigir a  “Missa Notre Dame”, de Machaut.
No dia 20 o certame reparte-se pelas instalações do Conservatório de Música do Porto (12 horas) com o Quarteto de Cordas da ESMAE, cujo programa assenta em Lucien Lambert (pianista e compositor francês) e na música francesa na viragem do séc. XIX. Mais tarde (17 horas) no Ateneu Comercial do Porto os solistas da Orquestra Bomtempo vão recriar a música do Salão do Porto na época da “Belle Époque”. O tempo não volta para trás, mas será bom recordar temas e composições que fazem parte das memórias de várias gerações.

Savall no Salão Árabe

No dia 21, no Salão Árabe do Palácio da Bolsa (21,30 horas) será, então, a vez do músico catatão Jordi Savall e Hespèrion XXI interpretar um programa de música intitulado “Um diálogo das almas”.
Referência maior da música e uma das personalidades de maior destaque na redescoberta de autênticos tesouros esquecidos na penumbra do tempo, Jordi Savall é um pesquisador de música antiga e apresenta-se em palco muitas vezes como violetista e outras como maestro. Figura cimeira da música historicamente informada, criou três ensembles (Hespèrion XXI (1974); La Capella Reial de Catalunya (1987) e Le Concert des Nations (1989) todos fundados com a eterna Montserrat Figueras. A sua música não tem fronteiras, possui rara beleza e magia,
rompe com estereótipos e são um instrumento de mediação para atingir nobres objectivos com gente de credos diferentes, religiões, políticas. Não admira pois que, todos os concertos agendados para os principais palcos da Europa e do Mundo esgotem rapidamente. Com uma pequena e significativa diferença: só em Portugal consegue-se ouvir Savall por um bilhetinho tão barato, 20 euros, coisa pouca.
Uma nota mais: no dia anterior à sua actuação no Porto (dia 20) Jordi Savall esteve em Lisboa, na Fundação Gulbenkian, cujo concerto intitulado “O Milénio de Granada” esgotou há vários meses, pouco tempo após ter sido anunciada a temporada de música da Gulbenkian.
Para o fim do In Spiritum prevê-se um programa igualmente imperdível a todos os títulos. Nos dias 22 e 23, no salão nobre dos Paços do Concelho (21,30 horas) o violoncelista americano Jed Barahal (mais um apaixonado do Porto, professor na ESMAE e no IPP) interpretará as belíssimas suites para violoncelo de Bach resgatadas do esquecimento por Pablo Casals. Acrescente-se um pormenor importante e raríssimo: as referidas peças serão interpretadas no violoncelo Montagnana, de Guilhermina Suggia. Será mais um reencontro de memórias e emoções na cidade da grande violoncelista.
“O Festival é uma simbiose de várias vontades e reencontros com a descoberta da cidade, seus espaços culturais com história e depois, a vontade de proporcionar ao público a fruição de obras fundamentais do reportório musical ao longo dos séculos. A programação assentou em critérios de grande exigência estética. Em síntese, será uma viagem no tempo”, sublinhou o maestro Cesário Costa.
Neste contexto, a programação divide-se em várias facetas e períodos da história da música, sonoridades que vão desde a música antiga – compreendida entre a época medieval e o Renascimento – até à música do séc. XX passando pelo período Barroco e música clássica, sem esquecer a música francesa do séc. XIX. Será, sublinhe-se, uma ligação entre culturas do Ocidente e do Oriente.
O In Spiritum é uma iniciativa da Associação Cultural In Spiritum, conta com o apoio da Câmara do Porto e da Associação Comercial do Porto, entre outros parceiros, instituições e mecenas.
Mais informações sobre o Festival em:  www. festivalinspiritum.pt ou através da página do Facebook.



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