O Vale Encantado


Não é um vale qualquer aquele que serpenteia o rio Bestança, Cinfães, espécie de altar feito em várias camadas virado ao céu, verde sempre verde, como num poema de Rosália de Castro. Em tempo de ruído por todos os lados já só lá vai quem gosta de ouvir a voz do silêncio ou aprecia ouvir o canto do pássaro espantado pela beleza da paisagem e geografia do lugar. Durante uma parte do trajecto o automóvel ainda rompe o alcatrão, mas depois, só apeado o passeante consegue alcançar o prado espécie de paraíso e bálsamo para dias infernais e depressão quase colectiva.

Apenas o rio, sempre o rio de águas cristalinas e ainda com borgas e carpas,  corre entre as suas margens e segue o seu destino até ao Douro, o mais belo da região, onde todos os anos são produzidos afamados néctares do Mundo. Tudo o resto permanece no seu estado natural, quase selvagem, alguns campos de milho, memórias de moinhos abandonados, palheiros de pastores, sinais de comunitarismo. Por aqui, o tempo literalmente parou. Não existe rede de telemóveis nem modernices tecnológicas. O cenário atordoa os sentidos, mais ainda quando a lua cheia ilumina o verde da paisagem e o ambiente de fábula torna-se real, verdadeiro. Ou será a imaginação recriada num filme rodado num vale agreste e majestoso?

Como não há vida sem sonho, convém sempre recordar um pormenor fundamental: foi graças ao empenho e dinamismo da Associação para a Defesa do Vale do Bestança, actualmente a celebrar 20 anos de pujante actividade que, contras ventos e marés, defendeu, protegeu e divulgou este importante património natural em redor do concelho de Cinfães. 



 

Para memória futura mais um pormenor:  em 2001 e por coincidência (feliz) fui à descoberta do rio Bestança,  suas paisagens, vales de encantar e gentes, o maior património afectivo e sentimental na geografia dos lugares. Nesses tempos de aparente euforia, uma empresa privada ligada ao Ambiente queria construir duas mini-hídricas neste rio classificado na Rede Natura 2000.  Como a população não permitiu semelhante atentado contra o património local, a Associação para a Defesa do Vale do rio Bestança lembrou-se (e bem) de denunciar os interesses, sempre os interesses que estavam por detrás do empreendimento. A pressão popular foi tanta que o projecto foi chumbado e agora, sempre que é possível revisito as belezas naturais do Bestança, sítios de encantar, Valverde e Tendais, símbolos de religiosidade popular em Enxidrô, os moinhos de Barrondes, a ponte românica de Covelas, a longa descida pelo rio Bestança. Foi o princípio de uma apaixonante descoberta.  A sedução pelo vale mágico continua. Parabéns à Associação para a Defesa do vale do Bestança e em especial, ao seu presidente, o advogado Jorge Ventura, pelo incansável trabalho desenvolvido em prol do Bestança, artes, tradições e culturas.

 

 

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