Irão e China dividem palmarés


Imagem de apresentação do filme “Silent house”

A história de uma família tradicional de Teerão retratada em Silent House, venceu o Prémio Dom Quixote 2023 da última edição do MDOC/Festival Internacional de Cinema Documentário de Melgaço. O cenário do filme desenrola-se num palacete dantes pertencente a uma das esposas de Reza Shan (o Xá do Irão, entre 1925 e 1941) e constitui, ao mesmo tempo, uma parábola sobre a complexa situação social e política do país, antes e depois do período revolucionário, quase sempre mergulhado num cortejo de horrores, prisões e mortes.

Além desta longa-metragem assinada pela dupla Farnaz e Mohammadreza Jurabchian, o júri premiou, na categoria de melhor curta e média metragem, o filme Will You Look At Me, já visto em Cannes, do realizador chinês Shuli Huang. Se dúvidas existissem sobre a vitalidade e prestígio destas duas cinematografias na Europa, as duas distinções ajudam a perceber a diferença e a importância que cada uma delas, assume na indústria do cinema mundial. Melgaço não foi excepção.

Na lista dos filmes concorrentes ao Prémio Jean-Loup Passek, o destaque do júri foi para Mighty Afrin: In The Time Of Flood (longa-metragem) do grego Angelos Rallis, Taxibol (melhor curta e média-metragem) do italiano Tommaso Santambrogio; Budapest Silo, (menção honrosa) da polaca Zsófia Paczolay e Astrakan 79 (2023) de Catarina Mourão (melhor documentário), um registo intimista de Martim que, aos 58 anos, relata memórias dos tempos vividos na antiga União Soviética, em 1979, influência dos pais, também eles militantes do PC e, naquele tempo, incitam o filho a viajar para Moscovo com o objectivo de fixar-se em Astrakam e cumprir os sonhos de juventude.

A história e a realidade cedo demonstram o contrário e utopia deu lugar ao pesadelo. O “ideal comunista”, a tal sociedade sem classes idolatrada por alguns, foi sendo dominada por uma criptocracia totalitária, ausência de liberdades, purgas estalinistas e, tanto os pais como filho, deixaram de acreditar nos “amanhãs que cantam”. O filme também é um belíssimo exercício de memória e durante muitos anos permaneceu na penumbra do esquecimento.

Catarina Mourão tem uma filmografia reconhecida internacionalmente. É autora de várias obras, entre as quais “O Mar Enrola na Areia” (2019) e “A Toca do Lobo” (2016) selecionado para o Festival de Roterdão e visto nas salas de cinema com assinalável curiosidade da crítica e do público. A cineasta e investigadora tem procurado trazer para os seus filmes temas relacionados com a família, a memória, o arquivo e o registo autobiográfico.

Imagem de apresentação do filem “Will you look at me”

 

Além dos 32 documentários selecionados no MDOC, teve lugar a exibição de Contos do Iraque, seguida da masterclass orientada pelo cineasta e fotógrafo iraniano Maythem Ridha, autor de uma vasta e premiada filmografia; mais a secção X-RAYDOC, onde o cineasta e professor Jorge Campos, deu a conhecer dois filmes fulcrais na história do documentário mundial completamente desconhecidas do grande público:  Stravinsky (1966) e Lonely Boy (1962) ambos de Roman Kroiter e Wolf Koenig.  Foi mais uma aula de história do Cinema, tudo dito de uma forma informal e com a sabedoria suficiente para captar a atenção e curiosidade dos frequentadores do festival. Por muitas e variadas razões, esta secção será para continuar a desbravar outros caminhos em futuras edições.

Como habitualmente e em paralelo ao certame, tiveram lugar as habituais sessões ao ar livre nas freguesias de Alvaredo, Chaviães, Castro Laboreiro e Melgaço, na última noite exibiu-se o documentário Cesária Évora, mais a secção Plano Frontal, cuja residência cinematográfica e fotográfica, orientada por Pedro Sena Nunes, deu lugar à materialização de vários projectos audiovisuais; o Curso de Verão Fora de Campo, programado pelo investigador José da Silva Ribeiro; além do projecto “Quem somos os que aqui estamos”, orientado por Álvaro Domingues e Daniel Maciel, tendo como ponto alto a exposição de fotografia, intitulada Labuta, de autoria de João Gigante.

Entre as várias iniciativas, vale a pena lembrar a fabulosa exposição de cartazes do cinema alemão, desde os anos 10 aos anos 30 do século XX, patentes no Museu do Cinema de Melgaço, que fazem parte do espólio documental de Jean-Loup Passek, o colecionador incansável que viveu toda a sua vida apaixonado pelo cinema.

O MDOC/Festival Internacional de Cinema Documentário de Melgaço só é possível graças à parceria estabelecida entre a Câmara Municipal de Melgaço e a Associação Cultural Ao Norte.

 

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