O título da obra ‘A
Arte Sou Eu’ poderá parecer provocatório à primeira vista, mas é muito
mais do que um simples livro no sentido literal do termo. Além de
excepcional qualidade gráfica e artística, ‘A Arte Sou Eu’ foi o texto
lido pelo pintor Jaime Isidoro, em Fevereiro de 2007, no decorrer da
cerimónia de homenagem promovida pela Câmara Municipal de Vila Nova de
Cerveira.
“Com esta expressão feliz, Jaime Isidoro
condensa, sintetiza e conclui todo o seu entendimento do que é a arte e a
sua acomodação em termos de projecto de vida e artísticos”, escreve
António Quadros, na nota explicativa sobre a razão e escolha do
projecto. Para quem o conheceu (como eu) a vida e obra de Jaime Isidoro
(1924-2009) ficará plasmada em duas expressões: Liberdade e Felicidade.
Depois, este trabalho agora editado pelas
Edições Afrontamento (só uma editora de resistência se atrevia a
publicar este ensaio) traduz não só a apaixonante vida e obra do pintor e
aguarelista, mas também o galerista e “agitador cultural” num tempo de
incertezas e liberdades cerceadas, o homem interveniente e activo sempre
à frente do seu tempo (desculpem a frase batida, mas não tenho outra
que traduza todo o labor e legado deixado no domínio das artes visuais)
avesso a academismos e a clichés, amante da Liberdade, incansável
divulgador da arte moderna. Como muita gente tem memória selectiva
recordo com particular emoção o papel pioneiro da Galeria Alvarez, no
Porto (foi única num tempo em que não existiam espaços culturais na
cidade) mais o papel interventivo da Casa da Carruagem, em Valadares, os
Encontros Internacionais de Arte realizados no país, entre os quais,
nas Caldas da Rainha, em 1977, onde muitos dos participantes (entre os
quais me incluía) tivemos de fugir devido a uma carga policial da GNR)
e,
depois, o início das célebres Bienais de Arte de Vila Nova de Cerveira, em Agosto de 1978, um prodigioso projecto de
descentralização cultural que, ontem como hoje, continua a animar culturalmente o Alto Minho. (Eu estive lá e testemunhei a alegria e admiração como gente de todas as idades e condições sociais viu pela primeira vez um quadro de Paula Rego ao som da filarmónica local).
depois, o início das célebres Bienais de Arte de Vila Nova de Cerveira, em Agosto de 1978, um prodigioso projecto de
descentralização cultural que, ontem como hoje, continua a animar culturalmente o Alto Minho. (Eu estive lá e testemunhei a alegria e admiração como gente de todas as idades e condições sociais viu pela primeira vez um quadro de Paula Rego ao som da filarmónica local).
Voltemos ao livro, mais de trezentas
páginas repartidas por cinco capítulos correspondentes às principais
etapas da sua vida e obra, as exposições do Salão de Belas-Artes e do
Salão Primavera, a primeira mostra individual ocorrida no Salão
Fantasia, no Porto, em 1945, onde Jaime Isidoro passa de “artífice a
artista”, depois o reconhecimento nacional e as distinções conseguidas,
entre as quais, o prémio José Malhoa e a bolsa de estudo em Paris
permitindo a sua aproximação à obra pictórica de Picasso, mais o
conhecimento de Maria Helena Vieira da Silva, Artur Bual e Polliakoff.
Como não podia deixar de ser o Porto, sempre o Porto, figura na sua
infindável lista de preocupações e fonte de inspiração para as suas
telas pintadas a óleo e aguarela, o rio Douro, o casario da Ribeira, as
suas gentes e paisagens, diversas tonalidades e matizes, seduções vistas
em diferentes ângulos e latitudes. Na pintura [de Jaime Isidoro] a arte
torna-se sedução. Nela, “a arte é a sedução mais parecida com o
milagre”, escreveu Agustina, num livro de homenagem ao pintor publicado
nos anos 70.
Numa publicação onde são reveladas “ideias e
conceitos sobre arte” do pintor portuense e a importância de Alvarez,
Amadeo e Nadir Afonso, ‘A Arte Sou Eu’ descreve, com particular detalhe,
outros projectos artísticos liderados ou partilhados por Jaime Isidoro,
“Pespectiva 74 e a Casa da Carruagem”, o aparecimento da revista de
Artes Plásticas, “1974 e o Manifesto de Vigo”, “Jaime Isidoro, o
Projecto Alvarez e a Escola do Porto”, sem esquecer uma pormenorizada
biografia e biobibliografia, além de fotos, muitas fotos, algumas delas
pouco conhecidas do grande público. No meio do livro profusamente
ilustrado e graficamente impecável (parabéns Eduardo Aires pelo design
e trabalho editorial) o leitor irá encontrar uma emocionante carta de
amor (“escrita em cerca de 90 dias e 90 noites”) onde se misturam
a poesia, gratidão e memória e cuja publicação apenas foi conhecida após
o falecimento de Maria Marcelina, a mulher e musa que sempre acompanhou
o artista ao longo da sua vida.
“O ensaio procura fazer uma abordagem
transversal sobre a obra de Jaime Isidoro desde os anos 50 até hoje.
Nunca podemos esquecer que o pintor teve um papel fundamental na
divulgação da arte e dos artistas, acrescido do facto de, nesses tempos,
não existirem galerias nem coleccionadores. Foi um divulgador da arte
moderna no país e no
estrangeiro. Sempre teve um olhar cosmopolita da arte. Hoje, fala-se muito em descentralização, mas a descentralização que, desde sempre esteve na sua mente podia passar pela construção de novas centralidades. Como se vê é uma estratégia perfeitamente revolucionária para a época, década de 70/80 do séc. XX. Jaime Isidoro
foi um visionário”, resume António Quadros Ferreira.
estrangeiro. Sempre teve um olhar cosmopolita da arte. Hoje, fala-se muito em descentralização, mas a descentralização que, desde sempre esteve na sua mente podia passar pela construção de novas centralidades. Como se vê é uma estratégia perfeitamente revolucionária para a época, década de 70/80 do séc. XX. Jaime Isidoro
foi um visionário”, resume António Quadros Ferreira.
“Este trabalho é um valioso testemunho
sobre o meu pai e, ao mesmo tempo, uma homenagem a um Homem que fez
tudo pela arte e pela sua divulgação. Tenho a certeza que irá revelar
aspectos menos conhecidos da sua vida de artista, galerista e agitador
cultural, bem como outras facetas ainda por descobrir. É um testemunho
para as novas gerações, uma obra de investigação que enobrece o seu
autor”, resumiu Daniel Isidoro.
‘A Arte Sou Eu’ será apresentada esta
quarta-feira, dia 6 às 18h00, na Cooperativa Árvore, pela professora
Fátima Lambert e pelo autor da obra, o professor António Quadros
Ferreira que, durante muitos anos leccionou na Faculdade de Belas-Artes
da Universidade do Porto.
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